ALTA CULTURA

Fórum E.D.A. — Quando a inteligência vence o medo

Paulo Briguet · 18 de Abril de 2024 às 18:35 ·

Começa nesta sexta-feira em Londrina a 4ª edição do Fórum Educação, Direito e Alta Cultura. Confira a entrevista com a organizadora do evento, Cláudia Piovezan

Eu estava lá desde o princípio, em 2018, e posso garantir: o Fórum E.D.A., idealizado e promovido por Cláudia e Edson Piovezan, é um evento imperdível, sobretudo para quem acredita que o resgate da inteligência é o modo correto de começar a resolver os problemas do Brasil.  

Na quarta edição do Fórum, que começa nesta sexta-feira, em Londrina, personalidades do meio conservador brasileiro estarão reunidas em torno dos três valores cujas iniciais compõem a sigla do evento: Educação, Direito e Alta Cultura.

Os palestrantes convidados formam um time admirável: Ricardo Vélez Rodríguez, Roberto Motta, Percival Puggina, Araceli Alcântara, Isabelle Monteiro, Diego Pessi, Henrique Lima, Sandres Sponholz e (uma grata surpresa!) Padre Antônio Fiori. A juíza e professora Ludmila Lins Grilo, que esteve presente nas três edições anteriores do Fórum, fará sua participação por vídeo, uma vez que se encontra exilada nos Estados Unidos, onde não pode ser alcançada pelas garras do patronato político brasileiro. Há seis anos, quando recebemos Ludmila pela primeira vez em Londrina, jamais poderíamos imaginar que a situação do país se deteriorasse a tal ponto.

Não por acaso, a questão da liberdade estará no cerne de todas as palestras do Fórum. Veja a seguir a entrevista concedida pela Dra. Cláudia Piovezan, organizadora do evento:
 

BSM: No tema do Fórum, encontramos as palavras decadência e resgate. A que ponto o nosso país decaiu e como podemos resgatá-lo por meio da alta cultura?

Cláudia Piovezan: Decaímos ao ponto em que não vivemos mais sob o regime do estado de direito ou sob o império da lei, que é o que nos dava uma certa segurança jurídica. Isso acontece, de forma assustadora, com aplausos e torcida de grande parte da classe jurídica e política e de praticamente toda a classe jornalística do país. Chegamos ao ponto em que, para se dar bem, o sujeito denuncia o desafeto às autoridades por “interações com golpistas”, o que é algo que em 2018 discutíamos apenas no campo da poética, ou seja, da mera possibilidade. O que é isso se não a mais absoluta decadência moral de um povo? A alta cultura nos recoloca em contato com as coisas mais elevadas, inspira-nos a buscar virtudes e contato com a transcendência e tem o poder de reordenar todas as coisas, além de nos permitir enxergar a realidade como ela é.
 

BSM: Quais foram os propósitos originais do Fórum E.D.A. e de que modo eles se modificaram (ou se ampliaram) desde a primeira edição, em 2018?

Cláudia Piovezan: O propósito do 1º Fórum era inicialmente promover um encontro de amigos, trocar conhecimentos e informações que estavam fora do debate público e dar acesso a uma outra realidade para quem não acreditava mais nas discussões vazias da mídia e do ambiente acadêmico e buscava entender a origem das ideias que permeavam a nossa sociedade. Hoje as pessoas estão mais informadas. Muitas palestras foram feitas e livros foram publicados, novos órgãos de mídia foram criados que abordam os temas que foram enfrentados no 1º Fórum, de modo que aquilo que era absolutamente novo em 2018 hoje está na conversa em praça pública. No entanto, nesse ínterim, instalou-se no país um regime de medo e de perseguição. O que discutíamos se tornou ainda mais proibido, daí a necessidade de resistirmos na defesa da liberdade de expressão. O tema do aborto ressurgiu com muita força e a família está sendo mais atacada, de maneira que neste ano vamos dar ênfase a esses temas, buscando a lei natural para explicar por que nenhuma lei humana pode nos proibir de exerceu um direito natural, inerente à nossa condição humana, a despeito de qualquer discurso ou espalhafatosa tese jurídica. Além disso, o que antes abordávamos como ativismo jurídico transformou-se em uma juristocracia, ou seja, houve uma mudança no regime político do país.
 

BSM: Na escolha dos palestrantes, nota-se que há uma convergência dos três fundamentos do Fórum: Educação, Direito e Alta Cultura. Fale um pouco sobre alguns destaques desta edição: Ricardo Vélez Rodríguez, Roberto Motta e Percival Puggina.

Cláudia Piovezan: Novamente conseguimos trazer palestrantes de alto gabarito em todos os eixos do fórum e contamos com grandes intelectuais no time deste ano. Vou destacar quatro deles que convidamos pela experiência, pelo profundo conhecimento, por uma vida dedicada aos estudados e por terem vivido numa outra geração e que podem nos auxiliar com conselhos e histórias de vida para que não percamos essas referências na transmissão do que é bom, belo e verdadeiro às futuras gerações. O Prof. Ricardo Vélez Rodríguez tem se dedicado a estudar a política brasileira desde os anos 70, tem uma vasta obra publicada, duas delas recentemente reeditadas pela Editora E.D.A. Para demonstrar que essa mentalidade totalitária que está instalada no país vem de longa data, nós o convidamos a mapear as ideias que contaminaram o Brasil de forma a nos fazer sempre retornar a regimes totalitários. Roberto Motta tem se dedicado também há décadas a estudar o fenômeno da criminalidade e da impunidade no Rio de Janeiro e no Brasil. Ele já ocupou cargos na iniciativa privada tanto no Brasil quanto no exterior, já integrou o governo no Rio de Janeiro na área de segurança pública, e vive o dia-a-dia com a violência absurda da cidade do Rio de Janeiro, então, como já fez em algumas de suas obras e faz diariamente em sua participação na Jovem Pan, ele vai nos mostrar os dados assustadores do resultado da frouxidão da justiça penal brasileira. Percival Puggina é um ativista da defesa da liberdade no Rio Grande do Sul, é um grande estudioso de regimes ditatoriais comunistas, tem excelentes livros escritos sobre esses temas, um deles chamado A Tragédia da Utopia, em que relata a ruína de Cuba sob o regime comunista. Por fim, destaco o Padre Antônio Fiori, um gigante em termos de conhecimentos filosófico, teológico, psicológico, literário, além de ser um grande cinéfilo. Quando o Padre Fiori fala, temos obrigação de parar para ouvir e meditar. Então quisemos trazer esse grande e discreto pároco da aldeia para ser conhecido pelos participantes do Fórum. Com esses quatro e os demais palestrantes, tenho absoluta certeza que todos terão algo para refletir no retorno às suas casas e às suas vidas. Os Fóruns anteriores nos mostraram que ninguém sai do Fórum E.D.A. como entrou.

 

BSM: Ludmila Lins Grilo participou de todas as edições do Fórum E.D.A. e agora também vai participar, mas de maneira remota. Você imaginou que chegaríamos a esse ponto?

Cláudia Piovezan: Partindo do princípio, ressalto que nunca achamos que haveria uma 4ª edição do Fórum, pois era para ser um encontro único. Eu creio que fui forjada para viver num regime repressivo desde a minha infância, meu imaginário começou a ser formado pela minha mãe e pelos livros que eu e ela líamos. Ao longo de minha carreira, por diversas vezes, eu me levantei a questão sobre como deveria me comportar quando (e não se) estivéssemos numa ditadura, então eu confesso que, devido à minha natureza pessimista, sempre trabalhei com a possibilidade de viver como estamos vivendo hoje e ainda vejo como algo muito provável que situações piores aconteçam conosco, como já aconteceu com a Ludmila. Obviamente não imaginei uma situação exatamente como essa, mas também lembro que no 1º Fórum tivemos a participação do Prof. Olavo de Carvalho por vídeo porque ele já era uma espécie de exilado político. Confesso que lamento enormemente por termos de ouvir nossa querida amiga Ludmila a distância. Ela esteve presente às três edições anteriores. Londrina se tornou quase uma segunda casa para a Ludmila e certamente estaria aqui não fosse a tragédia que se abateu sobre o Brasil.

 

BSM: Nada ocorre por acaso. O outono da liberdade no Brasil está sendo exposto ao mundo. De que modo o Fórum E.D.A. contribui para registrar esse momento histórico que muitos gostariam de apagar?

Cláudia Piovezan: As duas primeiras edições do Fórum estão registradas por vídeo, inclusive muitas das palestras estão no Canal do Fórum EDA do Youtube, acessíveis gratuitamente para o Brasil e para o mundo. No entanto, para além disso, a Editora E.D.A. tem feito um trabalho muito sério de transformar em livros todos os temas abordados nas edições do Fórum, tem registrado em livros muito da história atual do Brasil e tem trazido uma vasta e premiadíssima bibliografia estrangeira reforçando o que temos sustentado ao longo desses anos. Mas o mais importante é que o Fórum já inspirou muitas pessoas que estão levando adiante, das mais variadas formas, o que ouviram e aprenderam nesse ambiente livre de censura e arraigado na verdade.


BSM: Que tipo de obstáculo você e o Edson precisaram enfrentar para promover o Fórum?

Cláudia Piovezan: Já houve pressão para que os espaços em que o Fórum ocorreria rescindissem contrato de locação às vésperas do evento; promoção de boicote a empresa que colocaria stand de vendas no Fórum; já sofremos tentativa de assassinato de reputação em redes sociais; palestrantes que já haviam aceitado o convite acabaram desistindo e até hoje há pessoas que gostariam de participar mas não participam por medo de alguma represália ou perseguição. Em 2018 até tentamos obter algum patrocínio, mas não encontramos nenhum interesse, então decidimos fazer por nossa conta e risco mesmo. O que certamente nos dá toda a liberdade.


BSM: Nesta semana, uma das maiores conferências conservadoras da Europa, a NatCon, foi interrompida pela polícia na Bélgica. Corremos esse risco?

Cláudia Piovezan: No 4º Fórum? Não. Creio que tem coisas mais graves acontecendo neste momento. Nosso encontro é pequeno e o público é seleto.

— Mais informações e inscrições pelo e-mail [email protected]
— Os interessados podem fazer a inscrição no local do evento, a partir do meio-dia: Centro Pastoral da Paróquia Rainha dos Apóstolos (Av. Tiradentes, 43). Taxa de inscrição: R$ 350 por pessoa (com 50% de desconto para alunos do Clube do Livro).

 


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